Sangria é a perda ou extravasamento de
sangue por qualquer lesão ou mediante a intervenção humana, como se fazia
antigamente para tentar curar certas doenças. Vem tal palavra do espanhol sangría, que era uma prática médica
muito usual especialmente na Europa, realizada inicialmente por barbeiros, por
sua exímia habilidade no corte com navalha. Em tempos bem mais antigos, era comum, no mês de março, a prática das sangrias.
Os médicos pensavam que, assim como a natureza renovava a seiva das
plantas, da mesma forma o homem devia renovar o sangue. A nossa Literatura está repleta
de exemplos do uso da sangria como prática médica. Vemos isso em: Lima Barreto,
em “Triste Fim de Policarpo Quaresma”: “De noite, lia o padre Vieira, mas logo às primeiras linhas o sono
lhe vinha e dormia sonhando-se “físico”, tratado de mestre, em pleno Seiscentos ,
prescrevendo sangria e água quente,
tal e qual o doutor Sangrado”; Joaquim de Macedo,
em “A Moreninha”: “E além destas palavras não quis pronunciar
mais uma única sobre o seu estado. E, contudo, ele estava em violenta
exacerbação. O médico deu por terminada a sua visita. Algumas aplicações se
fizeram e um dos colegas de Augusto, que o tinha vindo procurar, fez-lhe o que
chamou uma bela sangria de braços”;
Machado de Assis, em “Memorial de Aires”: “Que valem tais ocorrências agora, neste ano de 1888? Que pode valer a
loja de um barbeiro que eu via por esse tempo, com sanguessugas à porta, dentro
de um grosso frasco de vidro com água e não sei que massa? Há muito que se não
deitam bichas a doentes; elas, porém, cá estão no meu cérebro, abaixo e acima,
como nos vidros. Era negócio dos barbeiros e dos farmacêuticos, creio; a sangria é que era só dos barbeiros.
Também já se não sangra pessoa nenhuma. Costumes e instituições, tudo perece”; em
“A Semana”: “A familiaridade com a morte
é bela, nos grandes momentos, e pode ser grandiosa, além de necessária. Mas,
aplicada aos eventos miúdos, perde a graça natural e o poder cívico, para se converter
em derivação de maus humores. É reviver a prática dos médicos de outro tempo,
que a tudo aplicavam sanguessugas e sangrias.
Quem nunca esteve com o braço estendido, à espera que as bichas caíssem de
fartas, e não viu esguichá-las ali mesmo para lhes tirar o sangue que acabavam
de sugar, não sabe o que era a medicina velha. Não havia que dizer, se era
necessária; mas o uso vulgarizou-se tanto que o mau médico antes de atinar com
a doença, mandava ao enfermo esse viático aborrecido. Às vezes, o mal era um defluxo.
Que é a loucura senão uma supressão da transpiração do espírito?”; Manuel
Antônio de Almeida, em “Memórias de um Sargento de Milícias”: “Poucos dias antes de chegar ao Rio o
capitão do navio adoeceu; a princípio nem ele nem alguém teve a menor dúvida de
que ficaria bom logo depois da primeira sangria;
porém repentinamente o negócio complicou-se, e nem com a terceira e quarta se
pôde conseguir coisa alguma.”
---
É isso!
É isso!
Nenhum comentário:
Postar um comentário