10 de set. de 2020

De onde veio o "PERU"?


De onde veio o "PERU"?

O peru, galináceo Meleagris gallopavo, embora considerado oriundo da Índia em tempos remotos e incertos, na espécie que se tornou doméstica é de origem americana. Os gregos e os romanos já se referiam aos meleagris (galos da Índia) mesmo antes de Cristo, mas como ave muito rara, como o foi mesmo até o século XV. Jacques Coeur, o grande comerciante e argentário enobrecido por Carlos VII, trouxe da Índia alguns casais de perus como aves raríssimas, ainda em 1450.  Afirmam, porém, alguns franceses que o bom Rei René tornou o peru conhecido na França no próprio ano em que morreu, em 1480. Outros dizem, entretanto, que só no século XVI, sob o reinado de Francisco I, lá ficou sendo conhecido o dindon, trazido da América pelo Almirante Chabot, valido daquele monarca. Examinando-se bem o  caso chega-se, porém, à conclusão de que os meleagris dos gregos e romanos e os dindons vindos da Índia eram espécies selvagens, indomesticáveis, pois não existe entre os perus domésticos nenhum tipo que não seja oriunda do Meleagris americano nas suas duas variedades — Meleagris Ocellata, oriundo do Iucatã e de Honduras, com bela plumagem dourada nos machos, e Meleagris  gallopavo, vulgar na América do Norte e no México, onde os espanhóis já o encontraram domesticado pelos astecas e donde foram ter à Europa, em quantidade tal que, embora raros ali no século XV, tornaram-se tão vulgares no século XVI que eram comidos até nas festas dos campônios, não obstante aluda apreciados, como até hoje, nos banquetes reais. É fora de dúvida, porém, que o peru doméstico, embora chamado na Europa da Renascença "galo da Índia", é de pura origem americana, do mesmo modo que os habitantes autóctones da América, até hoje, são denominados Índios. Aos faisões chamavam os europeus "galos de Limoges", e às nossas "galinhas de Angola", de hoje (a pintade dos franceses), chamavam "galinhas da Turquia", que são os mesmos Numida meleagris, cujas pintas brancas nas penas a lenda afirma serem manchas causadas pelas lágrimas de Eurimedeia e Melanipe, irmãs de Meleagro, transformadas naquela galinácea por vingança de Ártemis. Assim, o Pavo dos espanhóis, o Polo da Índia dos italianos, o Dindon dos franceses,  o Turkey cock dos ingleses e o nosso Peru são todos descendentes do Meleagris  gallopavo, encontrado pelos espanhóis nas Antilhas e no México, já domesticado pelos astecas. E peru ou perum, sem etimologia certa, só pode ser o nome indígena, que foi o guardado pelos colonizadores portugueses e, portanto, o mais exato para designar o galináceo, de carne tão delicada, mas caluniada, às vezes, por pessoas que, excedendo-se nos seus repastos festivos, atribuem a perturbação gástrica, decorrente dos excessos, à inocente carne da pobre ave. Mas é a sina de cada um. Essa nobre ave, outrora qualificada, pela sua bravura, entre as aves heroicas, assemelhadas a Meleagro, o herói do ciclo dos Argonautas, tendo o seu caráter deturpado pela escravidão a que o egoísmo da espécie humana a submeteu, é hoje simples símbolo da estupidez! Pobre galináceo!

Por: "SAPO"

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